21 de jun. de 2011

PARTE I

Resolvi escrever alguma coisa.
Entrei para a igreja com vinte e sete anos de idade. Igreja evangélica. Ou, digamos assim, voltei para a igreja aos vinte e sete anos de idade.
Meu pai estava doente e era minha base de vida, apesar de não conversarmos muito. Mas não achava justo que ele morresse tão jovem. Aos 55 anos de idade, vítima de um câncer em 1994.
Voltando um pouco no tempo, era meio incrédulo nestas coisas religiosas. Meu pai sempre foi um religioso e me levava nas missas todos os domingos junto com minha mãe e meus irmãos. Ainda não sabia o que era Deus ou do que se tratava este nome. Criança. Só queria saber de brincar.
Lembro-me de ter crescido com raiva de igreja porque eu preferiria estar no clube tomando banho de piscina ou mesmo jogando bola com meus primos, como era de costume na ainda pequena cidade de Teresina, estado do Piauí.
Fomos para São Paulo. Moramos quatro anos por lá. Bairro Jardim Bonfigliolli, à Rua Tapejara, não direi o número, pois meu pai vendeu a casa e creio que há moradores por lá. Um grande espaço. Um belo sobrado. Garagem para dois carros. Um corredor por fora enorme que em e meu irmão jogávamos bola de chute a gol. Por dentro da casa, no térreo, duas amplas salas, estar e visitas. Um banheiro de visitas. Uma ampla cozinha e uma área de serviços grande atrás com direito a dependência de empregada. Ao subir a escada estavam os quartos e mais dois banheiros. Saudades grandes. Gostava muito de São Paulo, mas meu pai continuava a nos levar para a missa todos os domingos.
Aquela voz do padre querendo dizer que era de fora, com sotaque arrumado dentro da igreja, assim como os pastores do bispo Macedo, que falam iguais a ele e os gestos são os mesmos. São totalmente preparados e treinados nos seus trejeitos.
Depois de São Paulo fomos para Belém do Pará. Linda Belém, onde conheci minha esposa, onde meus filhos nasceram. As coisas melhoraram, porque meu pai passou a viajar mais e só íamos para a igreja quando ele estava em casa.
Quando completei meus vinte e seis anos, ele aparece com câncer e sua vida começa a decair, juntamente com sua saúde. Alguém disse para mim que Deus era amor e Jesus era fiel e que iria curar meu pai. Aceitei a proposta, minha mãe e meus irmãos também. Estávamos todos emocionados. Angustiados. Tensos. Pois a cada dia meu pai definhava mais e mais. A nossa sorte era que os três mais velhos já trabalhavam e eu estava incluído neste meio.
Foram pastores e mais pastores na minha casa. Pulos, gritos, eu nada entendia daquilo. Meu pai faleceu, apesar dos pulos e gritos e de tantas orações.  Alguém nos pregou que o propósito de Deus era levar nosso pai para que a família se entregasse a Jesus. Com o velho jargão: se não vem pelo amor, vai pela dor. Pensar que eu acreditei nisso!
Dito e feito. Entregamos-nos a Jesus. Nessa época já estava casado. Nasceu meu filho em meio à dor de meu pai. Alguém disse: Deus está dando uma nova vida e uma nova esperança. Seis meses depois morre minha sobrinha de cinco anos com câncer no sangue: leucemia e a quimioterapia a abate muito e ela não resiste. Que nova esperança é essa?
Continuei na igreja. Fui aprendendo coisas que não conhecia. Comecei a ler a bíblia. Dediquei-me profundamente ao estudo dela, tanto que achei que tinha chamado para ser pastor. Fui músico (ainda sou, mas aposentado). Cantava, ministrava. Fui líder de louvor. Criei uma reunião de louvor na igreja denominada Louvor Saudade que até hoje existe dentro dela. Fui líder de ministérios, como o de casais. Fui líder de jovens. Evangelizava. Orientava casais, jovens, adultos e crianças. Participei de muitos movimentos de casais e jovens. Professor em escola bíblica dominical. Fazíamos shows em praça pública. Vigílias de oração. Consagração. Jejum.
Via muitas pessoas falando em “línguas estranhas” (sem tradução), pulos, gritos, cai-cai, mas nunca comigo. Muitos diziam que eu não me consagrava ou não me consagrava direito ou não pedia aquilo para mim. Fiz tudo isso e nada acontecia.
Escrevia artigos para revistas evangélicas. Em 2004 entrei para a faculdade e fiz Teologia. Formei-me final de 2008, início de 2009. 
Era muito proselitista e muito apegado às coisas de Deus. Não aceitava nada que fosse de encontro aos dogmas que aprendi. Não ousava ler outra coisa que não fosse ligado à palavra de Deus. Mas a própria Teologia trouxe-me coisas novas. Pude ver Filosofia. Sociologia. Antropologia. Matérias que nunca tinha estudado anteriormente e comecei a aprofundar-me nas informações.
Não me contentava mais só com o que via e lia na bíblia, comecei a buscar mais leituras. Fui consagrado a pastor em 2009, só que alguma coisa havia mudado.

PARTE II

Muitas igrejas levam seus obreiros a estudarem Teologia com o objetivo de capacitá-los mais para o ministério pastoral.  Quando a Teologia não é proselitista como exige o MEC, você vê muitas coisas que para muitos não era para se ver. Por isso, grandes igrejas formam suas próprias turmas de Teologia e os preparam com suas próprias informações. Com seus dogmas, interpretações e tradições.
            Foi este tipo de “informações” que passei a questionar. Já não mais acreditava em tudo aquilo que via, lia e não me contentava mais com a falta de respostas plausíveis. Não queria mais contentar-me com a fé. Ela já não era tão suficiente assim. Para piorar em 2009 fui consagrado a pastor.
            A coisa começou a pesar mais ainda. Via a alegria e ao mesmo tempo a preocupação estampadas no rosto de minha esposa. Ela também foi consagrada à pastora. Será que ela já percebia a mudança? Não duvido. A mulher percebe muito mais longe do que gente.
            Agora como lhe dar com o ministério e as mudanças de convicções? Foi um ano de sofrimento, pregar aquilo que não mais acreditava. Nunca daria certo e não deu. A igreja em um ano saiu de 04 pessoas (eu, minha esposa e meus dois filhos) para 58 pessoas. Comecei a transparecer que havia mudado. Que não mais acreditava em tudo da bíblia. Comecei a tirar os pulos, os gritos, o cai-cai, a língua só se fosse com tradução. A igreja percebeu ao longo de seis meses e logo dividiu-se e 50 pessoas saíram com os outros dois pastores que me auxiliavam. Restaram apenas oito. Que atitude tomar? Assumi de vez minha condição de não mais cristão. De não mais crer na bíblia como palavra de Deus. Entreguei o ministério. Assumi junto à minha esposa que já sofria demais com todo o acontecimento. Assumi junto aos meus filhos. Sou bombardeado. Se não fosse pela minha família e meu trabalho, talvez estivesse só hoje. Sou chamado de rebelde e que o diabo está trabalhando em minha vida, ou outros chegam e dizem que tudo isso é propósito de Deus. Foi um choque para minha esposa, mães e meus filhos. Para mim foi pior ainda. Só que tudo tem mudado.  
            Aprendi também que ética e moral não são relacionadas à religião alguma, pois existem religiosos que não as tem. É proveniente da própria pessoa
            Não posso dizer que me tornei um ateu convicto. Só o que sei sobre Deus é proveniente da bíblia, que já não mais creio. Quero ter a coragem de ainda buscar a Deus através de outros caminhos. Se assim continuar, a probabilidade é muito grande de não crer na sua existência, pois passei por grandes momentos de angústia após assumir e chorei muito, creio que só não fiquei pior porque tinha meu trabalho e caí de cabeça nele.
Foram doze anos de evangelho com dedicação. No meu apartheid, nos meus momentos de angústia, tristeza, solidão, lágrimas, após perder a fé, não recebi sequer uma palavra de Deus de consolo. Peço que ele o faça nestes momentos, pois a palavra dele para outros não serve para mim. A “revelação” dele para outros, não serve para mim. Eu quero ouvir dele próprio o que tem a dizer como orientação. Ainda não veio a mim em nenhum momento. Não me interessa o que tem os outros a dizer, pois o que eles tem a me dizer eu conheço.
As pessoas não aceitam que você tenha mudado. Que você foi utilizado grandemente dentro da igreja e não tem mais nenhum interesse ou mesmo credibilidade.

PARTE III

A minha tese de defesa no final da Teologia foi Criação versus Evolução. Li bons livros. Acessei sites sérios. História. Ciência. Antropologia. Filosofia. Ateístas. Argumentos lidos. Vi contradições históricas, temporais, que me fizeram refletir. Pensar. Pesquisar. Não me deixar mais levar pelas emoções, mas usar mais a razão.
Tornei-me honesto comigo mesmo e passei a me questionar. Abri meus olhos e ouvidos. O que faz crer que este povo tem prioridade sobre um livro sagrado que diz ser a palavra de Deus? Nada. Há informações discrepantes. Há conceitos na Teologia que não condizem com a verdade. Há jargões que são utilizados só para enganar. Há informações com não condizem com a matemática, probabilidade. Com o raciocínio lógico.
Assim como muitos, quero continuar com a coragem para questionar, criticar, pensar, não aceitar todas as coisas como única verdade, principalmente proveniente da religião.
Quero que as pessoas passem a ser honestas consigo mesmas e busquem por significados e não retenham para si somente o que lhes disseram.
Estou ainda engatinhando, mas o faço com responsabilidade. Vou continuar a jornada de crescimento e desmistificando a minha consciência.

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